Entrevista com Daniel Augusto Jr.

  Daniel Augusto Jr. hoje fotógrafo oficial do Corinthians, ja trabalhou em boa parte da imprensa de São Paulo. Em entrevista por email, ele nos conta um pouco do que esperar do fotojornalismo esportivo, e mais quando perguntado qual esporte é o mais difícil de registrar ele responde: Não existe o mais fácil. Cada um tem o seu grau de dificuldade. Tudo acontece muito rapidamente e, parafraseando Gilberto Gil, “é preciso estar atento e forte”.

  1.Já teve fotos vetadas de um treino ou por algum jogador?
R.:
Não, isso nunca aconteceu. Neste meu trabalho atual no Corinthians, eu sou meu próprio censor. Quando o Ronaldo chegou e começou treinar em janeiro de 2009, a maior fissura da imprensa era com o peso dele. É claro, que eu, trabalhando internamente, tinha fotos do Fenômeno sem camisa. Mas nunca publiquei. Em setembro do ano passado, o SENAC fez uma exposição sobre o centenário do Corinthians com as minhas fotos. Eu tinha a primeira vez que o Ronaldo tinha me mostrado sua barriga, para provar que ele começava a ficar em forma. Mesmo sendo uma exposição fechada, para um público reduzido, eu, ética, delicada e educadamente, pedi autorização para para poder colocar a foto na mostra. Ele, de pronto, concordou.

  2.Qual a diferença entre trabalhar para jornais, etc. e trabalhar oficialmente para um time?
R.: Quando você é fotógrafo oficial – não importa se de um time, ou do Presidente da República – precisa ter cuidado com o que divulga; por isso falei acima, que eu sou meu próprio censor. O caso que citei, do Ronaldo sem camisa, exemplifica bem. Se eu estivesse do outro lado, o da imprensa diária, e tivesse visto o Ronaldo sem camisa, com toda certeza ia correr para publicar, para “furar”, ou pelo menos tentar, os concorrentes.

  3.O que você tentar capturar quando trabalha com : judô, tênis, F1, vela, volêi e futebol?
R.: No esporte, seja ele qual for, temos que transmitir emoção. É preciso levar o leitor da nossa foto para dentro dela. O músculo que salta, o rosto de dor, o suor que escorre, o esforço do atleta para atingir o seu melhor índice. Convenhamos que não é nada fácil, não?
Uma das coisas principais e que devemos ficar atento ao fotografar esportes, é conhecer suas regras. Sem isto, você pode ficar perdido e não saber para onde apontar suas lentes.

  4.Quanto tempo já trabalha com fotojornalismo esportivo?
R.: Efetivamente como fotógrafo de esportes desde 1997 quando fui contratado para trabalhar no Lance, que era, até então, o primeiro jornal diário em cores, somente de esportes, 70% futebol. Mas trabalhando na imprensa diária, o esporte faz parte da pauta. Então com menos intensidade, nas redações por onde passei, eu sempre fotografei esportes.
Trabalhei alguns anos em uma situação que é a do “free-lance fixo”, um idiossincrasia do mercado, para as empresas terem profissionais a seu dispor, sem pagar as obrigações trabalhistas. Nessa período horrendo que, infelizmente, em começo de carreira somos quase todos obrigados a admitir, fotografei para o Placar, da Editora Abril, uma revista apenas de futebol.

5.Como foi a escolha de trabalhar nessa profissão? E se teve alguma formação acadêmica?
R.: Em 1976 eu estava no interior paulista, Jaú, estudando em um colégio agrícola. Tinha trancado a matrícula na PUC de São Paulo, onde eu estudava filosofia. Mas a vida no campo sempre me fascinou e lá fui eu. Não deu muito certo. Na volta, em 1977, não sabia o que fazer e um amigo, hoje meu cunhado, me sugeriu aprender fotografia. Eu topei, tinha 1.000,00 qualquer coisa – não lembro a moeda –  em uma caderneta de poupança; fui e comprei uma Pracktica LTL com uma lente normal 50mm e fui à luta. Comecei trabalhando como assistente de um fotógrafo de arte, Rômulo Fialdini; depois fui fotografar também como assistente de um outro fotógrafo, o Jean Solari, quando em 1979 fui convidado para ser sócio da Agência F4, a primeira cooperativa de fotojornalistas brasileiros, pioneira na luta dos repórteres fotográficos pela implantação de uma tabela de preços mínimos para o nosso trabalho, pela adoção da Lei do Direito Autoral, hoje 9610/98 (http://www.planalto.gov.br/CCIVIL/Leis/L9610.htm) para regulamentar a compra/venda do nosso trabalho e, também, pelo crédito da nossa foto quando impressa. Como você percebeu, acabei aprendendo fotografia na escola da vida e não me arrependo.

  6.Gostaria de trabalhar para times do exterior? Se sim, quais?
R.: De verdade????? Não. Nem na Seleção Brasileira. E aquí cabe uma curiosidade: o meu trabalho, nos moldes como eu o desenvolvo, não existe em nenhum lugar do Brasil, da América e ouso dizer no Mundo.
Um ou outro clube tinha um profissional que fotografava para o seu site. Depois que eu comecei, em janeiro de 2008, muita gente nos copiou, inclusive, fazendo as fotos dos bastidores, uma idéia minha, batalhada desde 2003.
Até pela falta de trabalho na imprensa diária, a idéia de acompanhar o Corinthians vinha desde essa época, quando fui convidado para fotografar para o site do Timão. Por um motivo ou por outro nunca tinha dado certo.
Quando o Andrés Sanchez, atual presidente, assumiu em 2007, voltei a batalhar por essa idéia junto do departamento de marketing do Corinthians e desta vez vingou.

  7.Qual a imagem mais inusitada (ou a preferida) que já tirou?
R.: Tenho algumas, todas ligadas ao Corinthians. A foto, linda, do gol do Tupãnzinho, dando o primeiro campeonato brasileiro ao Timão em 1990 é minha, exclusiva, quando eu trabalhava no Placar. Outra muito significativa, é do enterro do corinthianíssimo Ayrton Senna, quando eu fui o único profissional do mundo que entrou na hora do sepultamento. Outra imagem, é do ex-presidente Lula – corinthiano de carteirinha – em campanha presidencial em 1989, com o líder sul africano, Nelson Mandela. Pelé, que foi capa da primeira edição da revista Lance+ também me deu muita emoção.

  8.Viveria bem em outro trabalho?
R.: Acho que o ser humano se adapta a tudo na vida. Não veria problemas em ser um agrônomo ou dono de um bar temático Beatles. Acabei entrando na fotografia meio por acaso, sem nunca ter pensando. Viveria sim.

  9.Um conselho para alguém que pense em trabalhar com fotografia esportiva?
R.: Não seria extamente na fotografia esportiva, mas na fotografia. Como a grande maioria dos ramos profissionais hoje em dia, a fotografia também está saturada. A fotografia de esportes por ser uma vertente da fotografia, idem. Mas nada que com empenho, dedicação, força de vontade e paciência qualquer pessoa não possa conseguir. Acho que se você fizer essa pergunta ao J.R. Duran que faz as fotos da Playboy, ele dirá mais ou menos a mesma coisa.
Se alguém quiser se especializar na área esportiva, vai ter que fotografar muito, errar muito, para poder se colocar no mercado profissional.

  10.O que você pode me dizer dessa profissão?
R.: Vixi, tanta coisa!!! Que é prazerosa; difícil; pouco rentável financeiramente; nestes tempos digitais, muito cara: gasta-se uma verdadeira fortuna em equipamentos como câmeras, cartões, hd’s, computadores, programas, seguro, etc…etc.., e temos que vender esse trabalho por muito pouco. E todos esses equipamentos têm que ser renovados periodicamente, pois ficam defasados muito rápido.
Quem quiser entrar neste ramo vai ter que ter muita força de vontade, perseverança, grana para começar e paciência para começar a “estourar” na imprensa, se quiser ser um repórter fotográfico.
Hoje, além de tudo o que falei acima, existe uma tendência de os repórteres fotográficos começarem também fazer vídeos para completar sua reportagem. Os profissionais das agências internacionais que trabalham por aquí já começam a operar suas câmeras digitais para gravar/filmar também.
Tentando seguir essa tendência, fiz um curso em um final de semana para começar ter os primeiros ensinamentos de captura em movimento. Foi o suficiente para eu, de cara, desistir: o investimento em equipamento é igual ou maior que na fotografia.
Mas é uma tendência, e amigos que estão empregados já começam ter aulas de vídeo.
Outra experiência que tento passar: hoje em dia qualquer um tem uma câmera fotográfica, nem que seja de celular, e já se acha o maioral. Se qualquer um tem, qualquer um fotografa.
Os repórteres de texto em jornais e sites, explorados pelas empresas, são obrigados a fazer texto e foto junto.
Eu tento falar a quem está começando que, se os repórteres de texto fotografam, os repórteres fotográficos têm que começar escrever. Mas aí, o buraco é mais embaixo: para se escrever bem, temos que ter cultura, conhecimento, leitura; mas o nível das maioria das faculdades de jornalismo que estão pipocando aquí e alí é lastimável. O Facebook/Twitter vieram para mostrar e piorar esse estado de coisas, infelizmente.
Não se escreve bem apertando o botão “automático”, coisa que os repórteres de texto usam e abusam em uma câmera. É uma triste e dura realidade, mas quem quiser ser um repórter fotográfico moderno tem que ter estes conhecimentos.

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